Desde 3000 a.C. existem empresas familiares. Milênios se passaram. Temos um legado de cerca de 5000 anos. Do Paleolítico à Era do Conhecimento. Do trabalho artesanal à revolução industrial e tecnológica. Tudo tornou-se global. E global é o problema da longevidade dessa natureza de empreendimentos. Veja: De 60 a 99% são familiares. Cerca de 30% atinge a segunda geração e menos de 5% a terceira.
O que acontece?
Tudo depende de qual ângulo se observa: Liderança? Sucessão? Conflitos? Profissionalização? Cultura? Gestão?... No entanto, seja qual for a escolha, todos remetem à necessidade de desenvolver e manter uma cultura adaptável a mudanças, capaz de promover a transição de gerações, adequando ou trilhando novos caminhos. Nesta perspectiva, sinto até hoje um nó na garganta ao presenciar a dor existencial de um patriarca, falando da sensação de ver sua empresa escorrendo entre os dedos “Não sabemos mais o que fazer; a gente cresceu, formou patrimônio, mas nos perdemos...; não sou apenas eu que estou doente; nossa família adoeceu, nossas relações também”. Naquele dia apenas ouvi. Foi uma despedida para sempre.
No papel de consultora em gestão humana e estratégica, o topo do problema, na maioria das vezes, está na escolha da metodologia mais adequada para dar suporte aos dirigentes e familiares, de modo que encontre receptividade e abertura para o diálogo, a fim de que se desenvolvam e prosperem junto com a empresa, sem precisar passar pela fase do “tudo ou nada”. Na maioria dos casos constata-se que a busca de orientação ocorre quando a situação já tornou-se praticamente insustentável. O estado de cansaço somado ao acúmulo de mágoas e ressentimentos, por conta de expectativas frustradas, parece não mais ceder espaço para recomeços, ou, em certos casos, literalmente, ressurgir das cinzas.
Então, por onde começar?
Não se trata de definir as ferramentas, tal como um diagnóstico organizacional, por exemplo. É ir mais ao fundo. É conhecer o não dito e não evidente. É descobrir como resgatar elementos de uma cultura colaborativa, de ajuda mútua, que que normalmente prevalece nos primeiros anos da empresa, onde um ajuda o outro, sem medir esforços, e a recompensa está no negócio dar certo. O que os unia? Do que sentiam orgulho? O que fizeram para construir uma trajetória de sucesso? Para, a partir disso, retornar ao hoje, reorganizar os pensamentos, gerar novas opções e reconstruir o presente e o futuro.
Há alguns meses vivi uma experiência assim. No início não enxergava uma luz. Sequer o túnel. Aos poucos, o foco da conversa deixou a relação entre presente e futuro, e centrou na história de como tudo começara, e a distância entre as cadeiras onde cada um estava sentado diminuía. O relembrar dos desafios superados motivou não só a aproximação física, também a emocional, pois em meio às lembranças vieram risos. Foi aí que resgatamos parte do “amálgama invisível” que havia nutrido os sonhos e as conquistas daquela família. A dor das frustrações cedeu ao prazer de reconhecimentos positivos. E, quando perceberam, lá estavam eles falando novamente dos projetos futuros. Da rejeição ao modelo de liderança do “avô” revelou-se a figura de um “herói” admirado, respeitado. Uma mudança de percepção que modificou os rumos da empresa.
Então é fácil! Basta estimular uma conversa onde todos falam o que querem, resgatam suas memórias e resolve-se o problema. Não é, porém, uma conversa qualquer. É uma conversa coaching. Significa pensar juntos, orientados por um profundo respeito aos valores e crenças, onde a neutralidade e a objetividade do Coach contribui para melhorar a comunicação e os relacionamentos. São perguntas para que a família empresária filtre o que quer e por que razões quer, facilitando a reflexão e a busca de alternativas para resolver os problemas; fazer a escolha de opções mais apropriadas; identificar possíveis barreiras e como contorná-las; determinar ações, prazos e evidências que sinalizam que o caminho traçado está sendo seguido.
Enfim...
À vista disso, se mesmo quando tudo parece perdido, em um emaranhado de busca de culpados, frustração, mágoas e julgamentos, uma conversa coaching bem conduzida é capaz de gerar resultados surpreendentes, imagine se for utilizada como uma prática de aprendizado e interação contínua, com foco na prevenção, solução de problemas e no desenvolvimento? No mínimo, o que se pode obter é o cultivo do senso de pertencimento e o orgulho de solidificar raízes, de geração em geração.
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